sexta-feira, 26 de dezembro de 2014

PARTES



Ele se esqueceu das etapas
Por um medo antropofágico de titã
E afundou-se em agonizante silêncio.

Sonhara com as possibilidades
Por uma urgência de acontecimentos
E acordou na singularidade dos dias,
E foi derretendo em passadas largas.

Carregava a marca do rancor
Dentro do tempo e em forma variada
Que a vida lhe foi diluindo em sabores ásperos
E ele foi ficando cada vez mais sozinho.

Foi perdendo as partes da estória
E virando um lampejo em nossos dias
Mostrou-se ser algo além dos boatos
Pois era um homem de grandes miudezas.



Talbert Igor

quinta-feira, 13 de novembro de 2014

O DIA SEGUINTE



Ontem, um outro foi lembrado
Através de cem anos com versos dinásticos
Hoje, quinta-feira, outro é marcado
Com a morte e com o selo do fantástico.

Vens moldando palavras pelo barro da natureza
Com partículas de aves e com o papel fecundo
Pois de simplicidade que surge oriundo da clareza,
A ave sai do ovo, o ovo é o mundo.

Este ano nos roubou mestres de diversas fases
Foi-se pela música, a literatura e tantas outras vertentes
E, que no caminho fomos perdendo algumas bases
De gigantes que espalhavam talentos resistentes.

Ah, Manoel de tantos voos pela infância
Que no mapa líquido que escorre pela cor de tinta
Fazendo o amanhecer e fabricando sorrisos com abundância
Mas que foi sucumbido num abafado 13 do dia de quinta.




Talbert Igor

quarta-feira, 12 de novembro de 2014

SEM ANOS, PASSÁMO-NOS



A noite avança cintilante em nossas cabeças
E vamos ficando bêbados pelo tempo e pelo vento
Como se as lembranças que revivem do relento
Evocassem os amores abarcados em avarezas.

Somos dois corpos atravessando o espaço.
Sigo eu, observando aquela moça de outrora
E ela instigada pela figura distribuída em abraço,
Que oferece nostalgias na imaginação que se aflora.

Ela segue o seu instinto vitalício
Declarando não conhecer parte da escória
E pela experiência conseguida no artifício
Estamos nós, em palavras, remoendo a estória.

Eu falo do passado em passos conseguidos
Indo do ponto inerte para o ponto crucial
Ela observa, como quem se esquiva dos receios construídos
Corroendo gestos na distância temporal.

Somos resultantes de frases existentes
Em profecias mal resolvidas e ideais diversos
Que nas ações, nas escolhas e vertentes
Digo para que não sumas em pontos de microuniversos.

Pois, um dia, dentro de suas semanas
Entre um causo agudo e a acidez dum bom senso
Surgirá nos verbos ofensivos das entranhas
A fumaça ofuscante emanada pelo incenso.



Talbert Igor

segunda-feira, 15 de setembro de 2014

ÍMPAR


Um passarinho pulou, pulou ligeiro
Por sobre os meus olhos de cupim
Procurando consumir, o meu anseio primeiro
Desleixando o seu canto agudo por sobre mim.

Esta miudeza alada desfila seu tino
De galho para galho, vigiando em bicados        
Da astúcia e badogue que desvia do menino
Observando os ângulos, as arestas e os lados.

Meu pequeno anjo de penas matinais
Colore e reflete cada ponto de leveza
Aponta pinceladas com silêncio de incerteza
Do que acontece nas penumbras cardeais.

Primo dum tal Bluebird Bukowskiano
Avoando em ideias, palavras e boatos
Irmão do Corvo-Edgar que escapa do poço folheado
Das canções estendidas por sob retas dos planos.

A sobrevivência dos vaga-lumes é condenada
E no que segues escapando outra vez
Na cegueira aberta que sempre se desfez
O rastro que espalha e liberta na estrada.



Talbert Igor

terça-feira, 12 de agosto de 2014

RECADO PARA UM VELHO CONHECIDO




Não vou morrer de pessoa
Nem de folha que avoa,
Das raízes do juízo.                                                                                 

Sigo do atrito que se ascende em pólvora corriqueira
E na bala de Eastwood que desfila no deserto
Encontrando a fenda no peito aberto,
Do maldito e da escória que se espalha no verídico
Também disso, não vou morrer.

Nas areias amarelas que refletem tantos raios solares
E das pegadas que espalhastes
Através do ofício de caminhante
Desfazendo o erro constante
De olhar nuvens passageiras,
Supriste a vontade verdadeira
De ser sombra ecoante.

Mas tu, meu amigo cintilante
Compondo em mutações de dias
Fez-se verdade na agonia,
Repetindo a sentença de movimentos reclusos
Vivendo sob a ótica de duas esferas sombrias.

É preciso que se tenha memória,
Dentro do peito humano.
Criando a visão em cada plano
Desfazendo a sentença de cada estória.
E nos laços longínquos de ações acarretadas
Recriamos as passagens de outrora,
Para não morrer de solidão enraizada.



Talbert Igor


segunda-feira, 30 de junho de 2014

RODOVIÁRIA




Os tremores que surgem na placa terrestre
Paralisam a máquina morena de relva
Nesta cidade que se concretiza em selva
Ao corpo esticado no chão duma pedestre.

A epilepsia no cuspe e bolha se confunde
Com as marcas da calçada imunda,
No esgoto que escorre e que na veia se afunda
Uma mulher que se contorce e com a multidão se funde.

Os pés avançam em marcha apressados
E, nos pesos das mãos que carregam
Ao corpo epiléptico que veem, renegam
Com a face fixa de globos filtrados.

Os músculos em movimentos agonizam
Entre a entranha pressionada por tubulações
Na voz doutra caixa-d´água que se reclama
Seguindo a estrada liquida das plastificações.

A partícula se descarrega funcionalmente naquele metro
Ela que continua almejando a salmoura no instinto vitalício,
Atirando-se em qualquer migalha que surge por perto
Pois segue, a pobre diaba esticada ao pé do edifício.




Talbert Igor

terça-feira, 20 de maio de 2014

UM DEUS, UMA IDEIA



O deus pagão morreu no cume da montanha,
Aleijado de idéias e traído pelo berro da canção
Sucumbido pelo visgo amargo da peçonha
Como numa estória medonha ramificada pelo chão.

Nas artérias e nos rastros que o globo deixou
Nos quilômetros da mente traduzidos em calmaria
Que a natureza volta a cobrar nos sais de avaria
Pois nas cousas corriqueiras a carne fraternal passou.

O anjo torto combateu duramente sete vezes o mau agouro
E buscando o corpo pagão que jazia além das terras ao norte
Partiu do extremo voo rasante para um desfecho vindouro
Onde o equilíbrio de seu mestre tragicamente encontrara a morte.

O filósofo tolo divulgava as correntes asquerosas do mal
E de todos os mapas que o zodíaco expelira
Os homens ofertavam fertilidade dançando a Lyra
Sobre as tempestades incertas que cercavam Baal.

Então a romaria seguiu por todo o sempre semeando nova aurora
Surgindo em novas cabeças e se espalhando por novas canções
Pois o deus que zarpara em trilhas lamacentas de outrora
Ressurgia na estória pagã doutro ser em repetidas ações.

Os homens traem-se amistosamente e continuam a perpetuar a mazela.
Brindam com canecas de palavra e pratos de ideia,
Dividem em partes desiguais as partes da pangeia
Adorando formas de espiral e deuses remanescentes do ar.




Talbert Igor

sexta-feira, 11 de abril de 2014

UM LUGAR COM MARIA




Existe um lugar que se passa em meados de outrora
Que conduz à beira-rio sombreada por algarobas
Onde o sol se encontra centralizado na memória,
E os passos que atravessam esse rotineiro prado
Dum dezembro de cajueiro e dias perfumados,
Traduzem o passado no tempo comungado com Maria.

Pois sim, já fui teu filho andarilho
Num dos embriões que a vida nos oferece.
E, como quem permanece no mesmo trilho
Escalando teus muros em páginas de biblioteca
Voltando, como que em meio tom de prece
Para bem dizer nossa história duradoura.

Nesse quarteirão em que li seus muros de tamarindo
Vi que as minhas novidades continuam antigas.
Sendo que prossegues a desfilar novos filhos ano após ano
Entre as frases que distinguem a sua prole doutras proles
E, como palavras que seguem a mesma circunferência
Segues como a Maria mais abençoada desta terra.


Talbert Igor

domingo, 9 de março de 2014

PROCESSO




Ele tinha acabado de sair daquele prédio antigo e estava parado no ponto de ônibus.
-Ei, colega!         - gritou ela. mas no meio da multidão, ele não ouviu.
Mas ela chegou perto e tocou em seu obro:
-Ei, colega!
Ele se virou e a viu sorridente.
-Olá        - disse ele.
-Tá esperando qual?
-Brotas. E você?     - ele olhava para frente.
-Cabula...
-Legal...
-Esse professor é maluco! - disse ela.
-É... ele acha que a gente tem muita grana.
-Nunca vi encher tanto o saco para comprar material em tão pouco tempo, ainda por cima  desnecessário.
-Ser artista custa caro...   - ele fez ar de riso.
-Essa é uma das partes chatas.
-Vou nessa. O rodoviária b já chegou.
-Até a próxima.  - disse ela
Ele estava com tintas nas mãos, alucinado e exalando a aguarrás.
Ela ficou sorridente, cabelos tingidos de ruivo e pipoca na mão.




Talbert igor 

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

UM DIA MEMORÁVEL





A vida que deslizava no silêncio do cansaço
E, no transporte imaginado que criamos
Percorremos os atalhos de dias profanos
para compreender a simbologia dos laços.

Pois tu, caro irmão de signo compartilhado
Surgia em noite de praça embriagada
Como neblina que corta espaços na estrada
para sentar-se ao lado dum pobre desolado?!

Trazia consigo  um instinto aniversariante
E, nas cordas que soavam em blues dissonante
Para brindar com causos de fumaça.

Achamos graça na noite que se arrastava
E, na empatia de semelhanças que nos foi apresentada
Reconhecemos a irmandade num banco de praça.



Talbert Igor

quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

UMA PAUSA NO PASSO


Degraus movimentados surgem em bola matinal
Na matéria que desfila sob roda em ferrolho
Que engole, cuspindo pessoas em ponto cardeal
Do tinto em azia ao silêncio escuro do olho.

Fazer-se titã por sobre essa rua de adeus
Desviar dos restos moribundos que chiam e vagam
Que espalhados, rastejam às vielas e propagam,
O fogo amargo dos filhos de Prometheus.

Pois são longas as escadarias no templo de Zeus
Que o tempo da escuridão na mente humana,
Origina a anárquica ideia de desafiar a eternidade
Clareando as cousas por orações augustinianas.

Ser um misto da escória lusitana
No composto que resulta num planetário território,
Colorido - pálido - vencido e aleatório
Sob o céu escarlate dos heróis tupinambás.





Talbert Igor

segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

TERÇA E QUINTA



Ele a viu chegar e viu também os seus globos negros assim que ela surgiu em sua frente. Sentia uma necessidade em poder falar com ela.  E ele chegou perto e começou a pronunciar:

"Se te queres tanto a felicidade,
Por que andas a planejar dias incertos, ó moça de terras além-rios?!
Consegues sonhar tendo tão pouco
E sendo sobrenatural na maneira como enxerga o homem.
Sonhar assim não deve ser tão mal como dizem.
O pior mesmo é não conseguir nada, nem ao menos um lampejo de sonho..."

Ela interrompeu com certo ar de quem não gostou e precisa mudar de assunto:
-Conte um segredo...
-Um segredo?!    - disse ele assustado
-Isso mesmo. Vamos lá, tá tudo bem.
Ele contou para ela a estória do homenzinho que quase chegara a um acordo com o tinhoso quando tinha cerca de doze para treze anos.
Ela riu, e fitando seus olhos negros em sua direção, indagou:
-Qual teria sido o motivo para tal negócio?
Ele retribuiu  com um  riso amarelado e respondeu que deveria ser por alguma aposta infantil do dia a dia.
- Oxe, e essas coisas se dão por motivos assim, nesses níveis?   - perguntou ela
-De vez em quando..       - disse ele
-Hum...   -  ela continuou fitando, com seus globos negros, o pobre rapaz. Ao menos puderam conversar.





Talbert igor





domingo, 12 de janeiro de 2014

JOÃO DÔGA, O DEVOTO



Há sempre alguém que se destaca mais no meio do bando. Esse alguém tem uma mania que é uma um tanto mais estranha do que a dos outros. Não há prova o suficiente para mostrar se isso realmente aconteceu, mas o causo é que o João Dôga em toda festa da padroeira é o primeiro da fila.
Na festa da padroeira da cidade, João Dôga ajudara desde os primeiros raios matinais, como era de costume, a organizar a festa na igreja que acontecia na missa da noite. Carregava enfeites e tirava a poeira das imagens de santos, sempre fazendo reverência a São Pedro toda vez que passava pelo altar.
A noite finalmente chegara anunciando a hora da celebração para o povo que esperava ansioso. João Dôga foi uns dos primeiros da imensa multidão que preenchia os espaços da igreja, e logo que se sentou no banco de madeira, fitou em especial uma pequena cesta bem abaixo da imagem de São Pedro. Fitava e analisava como quem tinha planejado algo há algum tempo.
Logo o padre dava inicio ao ritual religioso. João Dôga rezava e cantava as músicas com um grande fervor que impressionava. Um amigo vendo aquela agitação chegou perto de seu ouvido e cochichou baixinho: “- Se você continuar rezando assim é capaz de que quando você chegar ao céu São Pedro abra as portas sem demora para que possas entrar!”.
João Dôga ria com o comentário do amigo e ouvindo o padre chamar os fiéis para poderem ofertar seus dízimos, reagiu, e em um movimento robótico, levantou- se do banco, seguiu firme a enorme fila para o altar.
Quando finalmente chegou a sua vez de ofertar, João Dôga ajoelhou-se frente à imagem de São Pedro e pronunciou por alguns segundos em voz alta para que todos ouvissem as suas palavras de fé. Foi quando a multidão na fila já estava impaciente, uma velha senhora cutucou seu ombro, pedindo para que ele desse o espaço para outra pessoa ofertar, pois a fila estava grande. João Dôga colocou a mão no bolso, pegou a sua oferta e já ia depositando sua quantia na cesta quando se virou para a senhora e ao mesmo tempo em que virou a cabeça sacou da cesta, em um golpe rápido e calculado, várias notas de dinheiro que foram para o seu bolso em um movimento uniforme. Ninguém notou o seu movimento com as notas.
João Dôga desceu do altar com um sorriso amarelo e logo depois voltou para o seu lugar no banco de madeira. Nem bem sentara, o amigo voltava a cochicharão em seu ouvido: “- O que você pedia de tão importante para ter demorado tanto?”.
João Dôga não demorou muito na resposta e disse com o mesmo sorriso amarelado:
-Pedia a São Pedro que quando eu morrer que ele me deixasse entrar no céu sem demora.



Talbert Igor

sábado, 11 de janeiro de 2014

CATA - VENTO




Quis dobrar a força dos tempos
Pra voltar àqueles dias em que o deus Cronos era nosso amigo.
Fiz valer a força empregada no querer
Dos meus meses, semanas e domingos
Agora o tempo é uma passagem
E os anos vestem velhos vestidos
De meus medos dos fantasmas
Remorsos antigos.
De nada adiantou lutar por frases
Do meu verso, do passado, o passado esquecido
O cata-vento segue lentamente o seu caminho revirando
O que deixamos por debaixo do tapete
Agora o tempo é uma passagem
E os anos vestem velhos vestidos
De meus medos dos fantasmas
Remorsos antigos.




Talbert Igor, Thalles Nathan / 2011