sábado, 21 de julho de 2012

UM ALQUIMISTA NA ESTRADA

                                         
                                                         (Imagem Isadora Furlan)



Sempre que passava, carregado de fardos, pela pequena estrada em direção ao vilarejo, podia sentir um cheiro forte e estranho que o vento trazia do meio da vegetação.
 Certa vez, voltava com meus camaradas para o vilarejo e parei em um ponto da estrada. Percebi aquele poderoso odor misterioso que cortava galhos secos de difícil acesso. Lembrei-me da história que contavam sobre um velho solitário que habitava aquelas bandas e o quão louco diziam ele ser.
-Vocês não sentem esse forte e estranho odor? Perguntei aos meus colegas. Nenhum deles parecia entender o que eu estava tentando explicar.
Convidei-os para irem a procura desse forte cheiro e nenhum quis me acompanhar. Diziam ser coisa do caipora, mas voltaram a falar a história do velho louco solitário. Logo depois partiram apressados com seus fardos nas costas.
Pus-me adentro ao mistério vivo de plantas secas, que pareciam esconder alguma coisa grandiosa, por causa da dificuldade que ofereciam aos movimentos.
Andei um bom tempo até chegar a um ponto razoável onde pude observar e ver uma cabana, palhas de coqueiro embaixo de uma enorme e carregada quixabeira.
Havia de tudo naquele pequeno ponto. Animais, objetos, frutas regionais e regionais ares mágicos de todo um imaginário sábio popular. Bodes em um cercado velho, uma pequena plantação de milho que era visitada por bicadas de uns agitados joões.
Pude ver uma figura que andava com passadas quase que calculadas, acompanhadas por cacarejos de galinhas observadoras. Era um homem, uma figura coberta por um traje de couro, quase que camuflado. Ao menos vi sua branca barba, um senhor enrugado do esquecimento moreno.
O velho homem parou em frente de um grande balcão carregado por vasos substanciosos, peças de ferro, couro e madeira que pareciam ser seus principais instrumentos. Revirava prateleiras e pela agonia com que derrubava suas frágeis cabaças parecia ser algo de uma necessidade extrema.
Eis que o velho surge com um enferrujado, mas eficiente facão. Começava a cortar fardos de umas palmas verdes e completava os cestos com um quase capim cinza.
Parecia não se importar com o suor que caia do seu corpo. Um Sofrer em uma gaiola de taliscas alegrava o seu trabalho, com um alaranjado raro para o fim do dia. Cores ditam o seu ritmo cansado.
Parou por um pequeno período de tempo para matar a sede em um pote de barro. Logo depois abriu uma garrafa de cachaça e bebeu uma dose, percebi seu místico, pois cuspia um pouco para o santo. Ria sozinho, criando coragem outra vez.
Seguiu em direção à seca vegetação, pude vê-lo sendo devorado no cinza da cor até ouvir um profundo e respeitado eco. Era a oração rimada do velho homem que fazia com que suas cabeças o seguissem adentro ao cercado de madeira.
Anoitecia e o homem parecia concluir seu atarefado dia.
De repente levei um susto quando pude escuta-lo como uma voz bem próxima, quase que como um segredo a dois, ele pronunciou:
- Mais um dia... Dominar e ser dominado! .
O sol iria dormir no pé da serra e o homem parecia se preparar para acorda-lo amanhã bem cedo. Eu me preparava para sair e voltar para minha casa, quando ia retomando ao caminho que me conduzira até aquele ponto, avistei ao virar em direção à estrada, o velho homem me encarando e se arrastando em minha direção.
Fiquei paralisado, pois não percebi o quão ele foi rápido ao fingir que entrava na cabana... E como ele foi parar bem atrás de mim tão rapidamente? O velho me observava sorrateiramente esse tempo todo.
Continuou vindo em minha direção com um tom de intimidação, quando já estava me alcançando, pronto para me atingir com seu movimento, eu acordei quase que como um susto de um grande pesadelo, em um lugar incomum para o meu abrir de olhos.
Percebi que tinha dormido por um bom período de tempo. Já não era mais um entardecer e olhando para o meu relógio de pulso, vi que eram duas da tarde. Estava com as roupas sujas e cobertas por muitas folhas, pequenos insetos passeavam por meu corpo.
Levantei do chão e me apoiei em um tronco de cajueiro. Pude perceber que estava próximo da cabana do velho homem, o fogão à lenha estava aceso com uma panela de barro que cuspia seus vapores para o teto. Não vi o velho e a cabana parecia estar sem ninguém.
Escutei gritos vindos do norte em direção ao caminho que tinha percorrido até chegar à cabana... caminho que ligava até a estrada. Gritos pareciam buscar alguma coisa.
Fui em direção ao caminho e chegando aos gritos, vi que vinham dum grupo de moradores do pequeno povoado.
Diziam que estavam me procurando, um deles contou-me que eu estivera sumido por quatro dias e que eles me procuraram esse tempo todo.
Faziam muitas perguntas de onde eu estive e o que estava fazendo. Contei-lhes a história do velho e de tudo que eu vi. Quis mostrar a esquisita cabana, o cercado e os animais para que acreditassem na minha história e vissem que a lenda do homem solitário era verdadeira.
Guiei aqueles camaradas até a localização de onde eu estivera. Chegamos e a cabana havia sumido. Tudo havia desaparecido, os animais, o cercado, o fogão e o próprio velho.
Avistei uma pequena gaiola feita de taliscas com penas alaranjadas que pareciam Ser de um Sofrer. Perto da gaiola pude ver uma pequena plantação de milho que já estava quase toda seca e sem vida, restavam apenas oito espigas que eram disputados por bicadas de uns desesperados e agitados joões.
Quando todos pensavam que eu estava louco e quando partíamos em direção ao vilarejo, todos escutaram uma oração que cortava aquela cor cinza e fazia um poderoso e respeitado eco na vegetação. Pude sentir que era o velho homem, pois aquele forte odor ecoava pelos ares como nunca tinha sentido antes.
Alguém gritou:
-Parece que estão recolhendo suas cabeças para o curral mais cedo.
Mais um dia, nada como dominar e ser dominado. 




                                       Talbert Igor

MEMORIAL AOS ANOS 90



O tempo é um inimigo frequente e o relógio é um algoz lento e preciso.
Antecipo os movimentos diários
E sofro as mazelas de uma mente confusa.
Quem discursa e observa esse fracassado?
Os espíritos e males talvez...
Desde os antepassados que vagaram como mesmo sobrenome.
Acho que sigo a linhagem desses meus miseráveis familiares
Que morreram com os mesmos comuns e fatais vícios.  
Questiona-se por remorsos e saudades,
Recordo e bato à porta do passado,
Da infância descalça destorcida.
O tempo é um inimigo frequente e o relógio é um algoz lento e preciso.



Talbert Igor

quinta-feira, 19 de julho de 2012

AOS PINGOS THERMAIS






                                                      (imagem Ana C. Major) 


Roubam-lhes as roupas do varal ou simplesmente desaparecem calorosas aos ventos thermais.
São muitos os latidos dos incansáveis seguidores
Através de casas e portões encadeados, cercados por um ar 78.

Enjeitam braços em moscas,

Mãos em feiras de pés,

Mãos e algumas moedas,

Moedas e algumas doses matinais para que se possa chegar ao final livre.

Salve, salve a louca madame!

Avistem a corcunda professora mãe do imaginário d’água.

As ações:

Lembranças à colega Refei... Pois é sempre que tentam para-la com seus trajes pretos em fitas amareladas, sinos acorrentados ao animal óculos escuros. Passos ao sol do meio-dia.

Passeia louco cambaleante ao som do berimbau,

Que de graça era a graça que gerava sorrisos amarelados,

 Sob a oferta de um pão-café ou um pé-de-roupa ao folclórico boneco cipoense.

Boneco pedra e arame, 
Algo caldo dos rabiscos encaracolados...

Lisos cabelos da loira portuguesa,
A melhor e mais odiada dentre pingos thermais da cidade.



    

                    Talbert Igor